O Samba

(27/01/06)

Aquele som estava alto e tudo estava girando. Aquele samba contava mais uma história de amor. Era um samba forte e lindo. Minha cabeça estava leve, aliás, meu corpo inteiro estava leve, efeito do excesso de álcool. Estava perdido no meio de uma multidão feliz, sambando aquela poesia e bebendo daqueles líquidos maravilhosos que fazem a terra girar. Meus companheiros estavam por ai, em algum lugar próximo ou distante, sambando, sorrindo e bebendo. Eu estava sozinho a ouvir aquela bela poesia cantada, que ninguém parecia prestar a atenção, no lirismo de sua letra. Ah, como era belo aquele samba.

A bebida estava acabando. Eu não me importava. O que importava era aquele barulho, aquele torpor, aquele samba perfeito. Minha consciência já não estava comigo. Só o samba. Algumas lágrimas rolavam quando percebia a genialidade do compositor. Aquele samba era feito para mim, falava de mim, dos meus amores, das minhas dores, da minha vida... Era agressivo na batida. Era sutil e belo nas palavras. Não sei se era o efeito da bebida, mas naquele momento era uma das coisas mais bonitas que ouvi.

Fechei os olhos e me entreguei totalmente ao samba. Dancei como jamais havia dançado em toda a minha vida. Senti-me vivo. Fortalecido no samba. Não desejava mais nada; só sambar, sambar e sambar. Eis então que me aparece uma morena de olhos brilhantes, tão imersa naquilo tudo quanto eu. Uma morena que, por um instante, me puxou de volta a terra e me fez notar a beleza da vida, a beleza do seu samba. Não, não era uma morena qualquer, era a morena. Linda, com seus cabelos enrolados caídos nos ombros. Ou o seu corpo que se movia, exatamente de acordo com a melodia da música, numa harmonia perfeita.

Ela sambava com perfeição, com emoção. Eu sentia nela toda a energia e toda a sutileza daquela música. Eu via nela todas as dores expressas nos versos do samba eu via nela um espelho de mim, com a diferença que ela era dotada de uma beleza estonteante. Embasbaquei-me e meu mundo, naquele momento, era só a morena dos olhos brilhantes que samba, samba, samba quase sem parar.

Ela era aquele noite. Perfeita e bela.

No ritmo desta noite quente eu sigo até os braços do samba. Pisando nas pedras do caminho até o encontro do bar e sentindo a batida do samba se misturar com a batida do meu peito. Um samba forte e lindo. Uma história de amor do jeito que deve ser uma história de amor: Cheia de ritmo, de vibração, de dança, alegria e amor. Ah, o amor! O amor que está em meus poros. No suor que escorre até meu colo. O amor que está no samba. E no povo.

E nesta dança eu me entrego. Esqueço da realidade e só penso na vida. Sim, na vida. A vida sem preocupações, sem violência, sem desemprego, falta de dinheiro, sem tristeza, sem pobreza... Penso que ali, naquele samba, nos minutos daquela batida perfeita, eu estou vivendo. Eu estou viva.

De olhos fechados, de respiração ofegante, de coração acelerado, de sorriso no rosto eu danço. E sinto alguém me observar. E sinto um arrepio no corpo. Ele ali, tão bobo, tão perdido, me olhando com um jeito tímido. Estamos tão pertos, numa dança tão nossa sem nem nos tocar. Eu senti o calor dele. O amor que estava em seus poros.

Ele me olhou nos olhos. E o nosso samba se encontrou.

Ps: Texto escrito a quatro mãos, há uns dois anos atrás, por mim e por Marina Morena espero que tenham gostado. Bom carnaval a todos e posts novos, provavelmente, só depois do carnaval.

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