A Intuição

- Duas rosas brancas.

A mulher, ainda estranhando um pouco o pedido daquele rapaz que aparentava ter algo em torno de 20 anos, esboçou algo parecido com um sorriso e pediu que esperasse um momento.

Passaram um, dois, três momentos, e ele ainda aguardava o seu pedido. Ansioso para receber as rosas e depois pensar o que fazer com elas. Seu joelho tremia levemente, num sinal de desconforto e pressa. O pedido das rosas brancas veio como um impulso. Ele simplesmente saiu do seu pequeno apartamento com isso na cabeça. Duas rosas brancas. Duas rosas brancas. Duas rosas brancas, para quê? Não sabia. Tinha certeza que teriam que ser 2, rosas e, ainda por cima, brancas.

- Aqui estão, custam 8 reais.

Oito reais!? Por duas rosinhas brancas? Que absurdo, pensou, mas o impulso era mais forte de que o sentimento suvino que lhe abateu ao saber do preço das rosas. Tirou da carteira uma nota de 10 reais, esboçou algo que queria parecer com um sorriso simpático. Esperou o troco, quando a moça falou:

- Desculpe a demora, tive alguns problemas para encontrar as rosas.

Olhou de forma simpática para a moça. Recebeu o troco. Saiu da loja, pensando qual seria o futuro daquelas rosas brancas. Rosas brancas. Para quê danado fui comprar rosas brancas hoje? Sentiu então uma vontade forte de tomar vinho. Precisava tomar uma garrafa de vinho tinto. De preferência barato. A boca salivava. Vinho tinto. Esqueceu as rosas por um momento, seguiu a um supermercado próximo, comprou uma garrafa de vinho tinto. Custou uns seis reais. Quatorze reais o custo dos seus impulsos de hoje até agora.

Seguiu para a sua casa, ouvindo Bob Dylan e pensando porquê isso. Vinho tinto, rosas brancas. Pensou. Talvez a sua intuição quisesse sexo. É! Não há nada mais estimulante sexualmente para ele do que vinho. E as rosas? Ah, as rosas são para conseguir a mulher. Sonhou. Busto farto, pernas de tirar o fôlego, batom vermelho e cara de safada. Cara de safada não. Tem que ter cara de inocente. É mais gostoso. Chegou no seu apartamento. Abriu a porta. Colocou o vinho na geladeira. As rosas em cima da mesa. E esperou a sua intuição indicar a próxima coisa para conseguir efetuar a sua relação sexual. Pensou. Sem camisinha. Muito tempo que não faço sexo. Cinco meses, talvez. E sem camisinha não rola. Não quero ser pai assim, tão cedo. É, é isso, a Intuição quer que eu compre camisinha. Vou comprar camisinha.

Trancou a porta do apartamento. Desceu. Foi a farmácia mais próxima. Comprou três pacotes de camisinha. Nisso daí foi cerca de oito reais. Meu Deus, estou gastando muito dinheiro. Saiu da farmácia quando, de repente, pá, trombou com alguém. Não teve nem tempo de ver quem era. Trombou, abaixou-se, pegou as suas camisinhas. Envergonhado, olhou para ela. Busto farto. Tá, as pernas não eram lá essas coisas, mas dava pro gasto. Não tinha batom. Será? Pensou ele. Arriscou um oi. Mas não conseguiu nada além do que um pedido de desculpas meio assim, como quem não quer dar. Dar nem as desculpas, nem, digamos, nada mais. É, as pernas não eram lá essas coisas. Seguiu para o apartamento.

Elevador. De repente, pernas. Não, não eram pernas. Eram esculturas. Era ela? Tá, o busto não era grande, e o nariz era meio tronxo. E o queixo? O que era aquilo embaixo do queixo? Uma verruga? Ah vai, coloca a bandeira do Brasil na cabeça e come por amor a pátria, pensou. Arriscou um, qual andar? Ela, o seu gostosão! Assustou-se. Não era bem uma voz fina. Aliás, não era uma voz fina. Era grossa. Temeu. O elevador chegou no andar. Saiu. Ela, ou ele, olhava-o esperando para ser convidado, ou convidada, para entrar. Ele nem olhou. Entrou depressa no apartamento. Trancou a porta. Respirou aliviado.

Bem, e agora? Já tinha gastado vinte e dois reais. E não sabia o que fazer com aquelas coisas. Rosas brancas. Vinho. Camisinha. Só faltava o mais importante. Pensou. A agenda. Ah, a agenda telefônica. Ela irá me salvar. Fechou os olhos, abriu a agenda. De olhos ainda fechados, colocou o dedo em algum lugar da página. Abriu os olhos. Nada, o dedo apontava para um espaço vazio. Essa intuição tá brincando comigo. Repetiu três vezes, até chegar em Janaína. É, é gordinha, tem cara de safada. Ah vai, tem peito. E as pernas não são esculturais, mas dão pro gasto. Sempre deu bola pra mim, aquela dandinha. É hoje. Ligou. Ela atendeu. Tá namorando. Com uma mulher! Djabo e eu aqui, na secura.

Triste e desconsolado com a Intuição, abriu o vinho. Tomou um gole. Colocou Chuck Berry no som. Uma rosa branca na boca. Lembrou-se dela. A boneca. Essa sim era perfeita. Busto farto, pernas grossas, batom vermelho. Ah, e aquele rostinho inocente. Um tesão. Encheu a boneca. E ao som da guitarra de Berry, no torpor do vinho, com uma rosa branca na boca e outra entre os grandes seios plastificados dela e a camisinha para não sujar o apartamento, teve a melhor trepada da sua vida. Até então.

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